“Novos olhares para velhos desafios” foi o tema da quarta mesa-redonda, na programação de ontem (08), último dia do 1° Workshop Brasileiro para Avaliação de Ameaças, Vulnerabilidades, Exposição e Redução de Risco de Desastres – BRAHVE, realizado em São José dos Campos. O evento teve início nesta terça-feira (06), reunindo pesquisadores de 7 países latinoamericanos e de várias regiões do Brasil para discutir gestão do risco de desastres, pesquisas, Marco de Sendai e implementação de Banco de Dados.
No último dia da programação da 1° Workshop Brasileiro para Avaliação de Ameaças, Vulnerabilidades, Exposição e Redução de Risco de Desastres (BRAHVE), pesquisadores de diversas universidades e do Cemaden, apresentaram projetos, experiências e propostas para fortalecer a gestão de riscos de desastres. As propostas mostradas forneceram informações e indicadores aos gestores públicos, de forma a permitir um planejamento e tomada de decisões para ações e políticas públicas intersetoriais.
Foram 6 apresentações de projetos, trabalhos de pesquisa e as experiências das aplicações práticas para ações diretas voltadas à governança dos riscos. Também foi feito o pré-lançamento do e-book : Redução da Vulnerabilidade para Desastres: do conhecimento à ação” (Reduction of Vulnerability to Disasters : from Knowledge to Action), cujos autores são pesquisadores do Cemaden, de universidades brasileiras e estrangeiras. O site do livro encontra-se disponível em:< http://preventionroutes.weebly.com/capiacutetuloschapters.html>.
Indicadores de risco de desastres no Brasil fortalecem políticas públicas na diminuição das vulnerabilidades
“Desastre é consequência da soma das falhas no desenvolvimento de uma sociedade.” Utilizando essa citação do pesquisador e geógrafo inglês Mark Pelling, o pesquisador e professor Lutiane Queiroz de Almeida, do Departamento de Geografia da Universidade do Rio Grande do Norte, iniciou sua exposição sobre a aplicação do Índice DRIB, cálculo que chega aos indicadores de riscos de desastres no Brasil.
Queiroz de Almeida faz a abordagem sobre as causas dos desastres “naturais” no Brasil, entre eles: as condições ambientais (que incluem clima, relevo, características geo-hidrológicas), estrutura da organização territorial e condições socioeconômicas e governança.
Para a análise e composição dos indicadores de vulnerabilidades, o pesquisador apresentou os componentes utilizados nos cálculos: a exposição das pessoas frente ao risco de desastres, a suscetibilidade (desde infraestrutura até fatores socioeconômicos), a capacidade de enfrentamento (de gestores, prevenção e alerta, serviços médicos, redes sociais e família, cobertura material) e a capacidade de adaptação.
“É importante lembrar que entre as carências das capacidades de adaptação, devem ser analisadas a educação e pesquisa, igualdade de gênero, proteção do meio ambiente, estratégias de adaptação e investimentos.”, destaca o pesquisador.
Gestão de risco de desastre com foco nas ações não estruturais
Para a redução de risco de desastres, a gerente de planejamento da Defesa Civil de Jaboatão dos Guararapes e pesquisadora da Universidade Federal de Pernambuco, Rejane Lucena, apresentou a proposta de analisar a configuração do município e a problemática de risco. Destaca que o foco nas ações não estruturais tem o objetivo de analisar em que medida a Gestão Pública Municipal tem investido no fortalecimento da governança para gestão de risco de desastres, com olhar nos aspectos da vulnerabilidade institucional e das ações não estruturais.
Para a pesquisadora, as prioridades de ação devem focar em políticas públicas intersetoriais, com característica multidisciplinar. Também destaca a importância da gestão compartilhada com foco na prevenção, planejamento participativo e instrumentos de gestão.
Classifica como velhos desafios o conhecimento e a compreensão do risco, a intersetorialidade entre as políticas públicas e planejamento integrado, além do fortalecimento do diálogo junto à população para redução de risco de desastres. Para as novas perspectivas e novas posturas, cita a melhoria da capacidade institucional para prevenir e reduzir perdas, planejamento participativo e de compartilhamento, além da descentralização. “O trabalho com foco na educação para prevenção de riscos e o diálogo com a população são pontos essenciais a serem efetivados.”, destaca. Rejane Lucena lembra, também, do trabalho voltado à resiliência, envolvendo a educação e e empoderamento de escolas e comunidades, além de outras ações para a efetiva diminuição de riscos de desastres. “É preciso construir uma visão holística a respeito da gestão de risco de desastres, rompendo, definitivamente, com o foco na resposta e investir na prevenção e na preparação”, enfatiza.
Formulação de políticas para o aperfeiçoamento do gerenciamento dos riscos de desastres associados a deslizamentos
O Projeto de Fortalecimento da Estratégia Nacional de Gestão Integrada de Riscos em Desastres Naturais (Gides) foi apresentado pelo cientista Tulius Nery, tecnologista do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.
Esse projeto, desenvolvido por quatro ministérios do governo federal em parceria com a Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica), recebeu da ONU o Certificado de Distinção no Prêmio Sasakawa, no último dia 25 de maio, em Cancún, durante a Plataforma Global de Redução de Risco de Desastres.
No eixo “Monitoramento e Alerta” o projeto é desenvolvido por pesquisadores e tecnologistas do Cemaden, junto aos pesquisadores japoneses da Jica.
“O projeto visa dar suporte à formulação de políticas e ao desenvolvimento de metodologias para o aperfeiçoamento do gerenciamento dos riscos de desastres de movimentos de massa.”, destaca o pesquisador Nery.
Tulius Nery apresentou, também, as recomendações gerais do Projeto Gides para a Previsão e Alerta. Entre elas está a fundamentação científica dos dados e análise estatística, alerta centrado na probabilidade de ocorrência do processo( incluindo aspectos de vulnerabilidades), sinergia interinstitucional nos três níveis de alerta, extensão das metodologias para os demais municípios e estados monitorados, aplicabilidade do alerta, entre outras recomendações. Fez abordagem sobre a emissão e transmissão de alertas e os critérios adotados para os níveis desses alertas.
Finalizou explicando a proposta do Projeto Gides na pesquisa e desenvolvimento para melhoria dos alertas e alarmes e no pós-projeto. “Após o projeto Gides, há a previsão de gestão integrada regionalizada, com planos de ações e estratégias, projetos de redes observacionais e técnico-científica, entre outras, e a formação de um comitê gestor.”
Desafios : riscos, ameaças e vulnerabilidades estão mudando
A pesquisadora do Cemaden, Liana Anderson – que desenvolve projetos de pesquisa relacionados a riscos e desastres associados a incêndios florestais – inicia sua exposição apresentando diversos pontos para reflexão, com relação à Amazônia : “Estamos vivenciando mudanças nos padrões temporais de eventos extremos, pois o risco e a ameaça estão se intensificando. Estamos com novos recordes de cheias e secas, e as vulnerabilidades estão aumentando.”, destaca a pesquisadora e conclui : “Temos novos desafios e novos desastres e não temos históricos de desastres associados a incêndios, mas não precisamos esperar uma catástrofe acontecer para fazer algo. Precisamos inovar no modo de fazer ciência, não dependendo somente de séries históricas de ocorrências.”
A pesquisadora apresentou o projeto piloto que está sendo desenvolvido no estado do Acre, relacionado a um sistema de alerta focado em risco de desastres associados a incêndios florestais. “As projeções climáticas indicam o aumento da intensidade e da frequência dos extremos. Isso já é uma realidade no Acre.”, afirma a pesquisadora Anderson.
Lembra que o padrão definido de sistema de alerta pela UNISRD ( Escritório das Nações Unidas para Redução do Risco de Desastres) orienta sobre a necessidade de quatro eixos fundamentais: o conhecimento de risco, o serviço de monitoramento e aviso técnico, a comunicação e divulgação do aviso e a capacidade de resposta da comunidade.
“ No sistema de alerta no projeto piloto no Acre, o risco é uma combinação de perigos e vulnerabilidades.”, destaca a pesquisadora. Ela explica que os perigos estão nas secas, uso do solo, história de incêndio, temperatura e umidade. As vulnerabilidades devem ser analisadas pelas políticas institucionais, socioeconômicas, ecológicas, serviço técnico de monitoramento e aviso. “São a base científica para a previsão e a previsão de riscos, os impactos e os custos”, enfatiza.
Fortalecimento da Rede de Pesquisadores em Riscos e Desastres
Mário Freitas, da Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC), apresentou os desafios e ações associados à constituição de uma Rede Brasileira de Pesquisa em Redução de Risco de Desastres, dinamizada, desde 2013, pelo então Centro de Excelência para a Redução do Risco de Desastres (CERRD/UNISDR).
O pesquisador ressaltou os avanços empreendidos nos diferentes workshops promovidos por esta rede, a missão, as diretrizes e princípios, bem como as linhas de pesquisa construídos pelos diferentes pesquisadores (as) que têm participado desse esforço coletivo. Como fruto desse esforço, destaca-se a realização do I Congresso Brasileiro de Redução de Risco de Desastres, ocorrido em Outubro de 2016 em Curitiba/PR, bem como a organização da segunda edição do evento, a ocorrer em Outubro de 2017 na cidade do Rio de Janeiro.
Redução da vulnerabilidade para desastres: do conhecimento à ação
O pesquisador e sociólogo do Cemaden, Victor Marchezini, fez o pré-lançamento do e-book Redução da Vulnerabilidade para Desastres: do conhecimento à ação” (Reduction of Vulnerability to Disasters : from Knowledge to Action). Além de Marchezini e Ben Wisner, a organização do livro também conta com as pesquisadoras do Cemaden, Luciana de Resende Londe e Silvia Midori Saito.
“Entender as abordagens multidimensionais da vulnerabilidade é essencial para encontrar caminhos para a redução do risco de desastre.”, enfatiza Marchezini. Explica que o objetivo do trabalho é promover o debate no Brasil e nas Américas sobre a redução da vulnerabilidade a desastres, analisando suas dimensões social, econômica, ambiental, política, técnica e institucional.
Quais são as causas e as pressões dinâmicas de vulnerabilidade? Como e até que ponto as vulnerabilidades se entrelaçam nas fases de preparação, resposta e recuperação? Quais são os obstáculos e pontes para os vários atores trabalharem para reduzir vulnerabilidade? Como os conhecimentos local e tradicional podem ser combinados com o conhecimento de especialista externo para reduzir desastres?
O livro traz seções com diversas abordagens para a redução da vulnerabilidade. Os 28 capítulos estão organizados em quatro seções: modelos conceituais para a compreensão da vulnerabilidade; contextos geográficos e históricos; vulnerabilidade como conceito e sua avaliação quantitativa e qualitativa. Traz ainda uma seção que propõe como organizar e reproduzir esforços sustentados em direção à redução de vulnerabilidade a desastres. Marchezini também apresentou as considerações e observações sobre a progressão da vulnerabilidade, as causas de fundo e as pressões dinâmicas que geram condições inseguras, bem como outros elementos do modelo analítico Press and Release Framework (Wisner et al, 2012), que permite compreender as dimensões de criação do risco de desastres dentro dos modelos de desenvolvimento econômico. “O livro contemplará capítulos que nos ajudam a entender os desastres como processos que não são naturais, da mesma forma que as mudanças climáticas também não o são”, afirma o pesquisador. “Precisamos de uma visão integrada entre as ciências a fim de enfrentarmos desafios que são urgentes”, concluiu o pesquisador.
Informações gerais sobre o evento
Mais informações sobre o 1° BRAHVE (Workshop Brasileiro para Avaliação de Ameaças, Vulnerabilidades, Exposição e Redução de Risco de Desastres) podem ser acessadas pelo link