A complexidade do monitoramento, os avanços científicos para as projeções e os desafios da ciência-política para a mitigação dos efeitos da seca foram abordados no Cemaden, na programação da Série Debates “Ciência, Riscos e Desastres”. Entre os desafios, estão os aumentos da frequência e das intensidades das secas, ocorridas nas últimas décadas, em grande parte do planeta, que podem estar relacionadas às mudanças climáticas.
Os desafios da implementação do conhecimento científico na gestão do risco e o monitoramento do semiárido brasileiro foram os focos da palestra da pesquisadora Ana Paula Cunha, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, realizada ontem (31), em São José dos Campos, com transmissão ao vivo pelo youtube, dentro da programação da Série Debates “Ciência, Riscos e Desastres”.
“Por ser um fenômeno gradual, os impactos e efeitos da seca se acumulam, lentamente, ao longo de um período considerável de tempo. O efeitos da seca podem perdurar anos, mesmo após a finalização do evento, com diversos impactos socioeconômicos.”, enfatiza a pesquisadora Ana Cunha do Cemaden.
O monitoramento que o Cemaden faz no semiárido brasileiro abrange a área de atuação Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste( Sudene). Essa área é formada por 11 estados brasileiros, constituídos pelos estados da Região Nordeste, incluindo o norte dos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Engloba uma população de cerca de 22 milhões de pessoas, somente na região do semiárido brasileiro.
Em 2012, o Nordeste teve a pior seca dos últimos 30 anos. Segundo os dados da pesquisa Produção da Pecuária Municipal, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), a região perdeu 4 milhões de animais.
“A seca é um desastre natural que não está diretamente relacionada a vítimas fatais, porém, atinge o maior número de pessoas impactadas, causando mais perdas econômicas, relacionadas às atividades agropastoris.”, esclarece a pesquisadora do Cemaden, destacando que a seca está classificada como o terceiro desastre natural em ocorrência no Brasil, ficando atrás de inundações (em primeiro) seguido de deslizamentos.
Seca e degradação do solo
A área com condições áridas está projetada para crescer e cobrir áreas atualmente subúmidas e seca, principalmente em 2100. A pesquisadora citou estudos científicos que demonstram o aumento da aridez – combinada com a degradação da terra – pode aumentar o risco de desertificação. Lembrou que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês) fez a advertência contra perdas de safra até o final deste século. E isso não poderá ser compensado, mesmo com a adaptação, especialmente se as temperaturas médias subirem mais de 2 graus acima dos níveis pré- industriais.
Tipologias de seca, monitoramento e desafios
Com relação à complexidade do monitoramento, foram abordados os avanços para a modelagem das projeções da seca, realizadas em todo o mundo, já que – como “fenômeno gradual” – torna-se difícil determinar o início e o fim da seca. Além disso, a pesquisadora exemplifica que há tipologias de secas, que ocorrem interrelacionadas: a seca meteorológica ( redução das chuvas), a seca agrícola ( solo afetado) e a seca hidrológica (redução do nível dos reservatórios e rios). “A definição e o impacto das secas são altamente dependentes de condições geográficas e meteorológicas locais.”, afirma. Abordou os conceitos do monitoramento e os dados integrados pela rede observacional, provenientes de satélite, meteorológicas, hidrológicas e dados biofísicos geográficos.
Para superar os desafios do monitoramento e mitigação dos impactos da seca, deve-se construir a regra do “conhecer mais para perder menos”. “Para isso, o desafio da implementação da gestão de risco fica condicionado à desfragmentação dos conhecimentos dentro e entre as instituições, destaca a pesquisadora. Explica que a junção de dados, informações, associados aos conceitos teóricos, permitem a aplicabilidade eficaz desses conhecimentos para a busca de soluções.
Ciência cidadã na agricultura familiar do semiárido
Especializada no monitoramento dos impactos das secas no semiárido brasileiro, atualmente, a pesquisadora Ana Paula Cunha, trabalha no projeto do Cemaden, em conjunto com outras instituições, para o aprimoramento de uma ferramenta de “crowdsourcing” inédita no Brasil, por meio do aplicativo denominado “AgriSupport” .
Considerado uma “ciência cidadã” o aplicativo foi desenvolvido para a utilização do celular na coleta de dados feita pelos produtores da agricultura familiar do semiárido brasileiro e enviados ao Cemaden. As informações recebidas via internet são inclusas nos dados do Relatório das Secas e Impactos do Semiárido Brasileiro, elaborado por uma equipe multidisciplinar do Cemaden. Esses dados também contribuem para que as instituições de assessoramento técnico-agrícola possam dar um retorno aos produtores da agricultura familiar, além de permitir o aprimoramento dos programas de políticas públicas.
A palestra na íntegra “Os avanços e desafios ao monitoramento dos impactos da seca no semiárido do Brasil” – da pesquisadora do Cemaden, Ana Paula Cunha, está disponibilizada no youtube –Série Debates – endereço https://www.youtube.com/channel/UCli7dG6pJ6wPkJs53x3FK-w