SUMÁRIO
Nesta quinta edição do boletim mensal de previsão de impactos em atividades estratégicas para o Brasil, o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), apresenta os cenários mais prováveis de impactos nos recursos hídricos e na vegetação, em diferentes setores do Brasil, bem como na agricultura familiar de sequeiro para o semiárido, no decorrer do trimestre dezembro de 2018 a fevereiro de 2019 (DJF/2019). Os destaques são a situação do Sistema Cantareira, as projeções para as vazões afluentes aos reservatórios de Três Marias e Serra da Mesa e os possíveis cenários para os volumes armazenados nos açudes monitorados no semiárido da Região Nordeste, nos meses subsequentes.
A situação de armazenamento do reservatório do Sistema Cantareira ainda é crítica se comparada a novembro do ano anterior. Em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, o modelo hidrológico indica que este reservatório poderá chegar a fevereiro de 2019 em melhor situação comparativamente ao mesmo período de 2018. Com o início do período chuvoso na grande área central do Brasil, os valores médios mensais de vazão neste sistema aumentaram em relação aos meses anteriores, ainda assim o modelo indica que vazão ficará abaixo da média no decorrer do próximo trimestre. O mesmo poderá ocorrer nas sub-bacias de Serra da Mesa e Três Marias, ou seja, as vazões podem apresentar uma situação mais favorável que no mesmo período do ano anterior, porém abaixo da média.
Considerando um cenário hipotético de chuvas 20% abaixo da média histórica para o trimestre DJF/2019, cerca de 27 municípios, em sua maioria localizados na parte leste do Estado da Bahia, poderão apresentar queda na produtividade agrícola e/ou pecuária. Isso ocorreria em razão da atual condição de estresse hídrico no solo desses municípios. Já para um cenário de chuvas em torno ou abaixo de média, o número de municípios impactados seria bem menor.
IMPACTOS EM HIDROLOGIA
Evolução do Armazenamento no Sistema Cantareira
O monitoramento do Sistema Cantareira – sistema que abastece parte da região metropolitana de São Paulo – mostrou que seu volume útil atingiu 34,2% em 20 de novembro de 2018 (Figura 1), valor inferior ao observado no mesmo período de 2017 (44,3%). Mesmo em um cenário de chuvas dentro da média, o modelo hidrológico PDM/Cemaden[1] sugere que a vazão neste sistema atingirá valores médios em torno de 10% abaixo da MLT no próximo trimestre. Ainda considerando este mesmo cenário de chuvas, o volume útil armazenado poderá atingir valores em torno de 63,6% no final do período chuvoso, em 31 de março de 2019. Esta simulação[2] considerou: (i) vazões afluentes simuladas pelo modelo hidrológico PDM/Cemaden; (ii) vazões defluentes para a bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí iguais às médias praticadas entre os anos de 2014 e 2016 (nov-mar = 1,55 m³/s); (iii) vazão de extração para o Elevatório Santa Inês (abastecimento de São Paulo) de acordo com a resolução conjunta ANA/DAEE Nº 925; e (iv) interligação com a bacia do Rio Paraíba do Sul com vazão média de 5,13 m³/s, de acordo com a resolução ANA Nº 1931.
Reservatório de Três Marias, Bacia do Rio São Francisco
Devido ao excesso de chuva em novembro (até o dia 28), a vazão média afluente ao reservatório de Três Marias, no alto São Francisco, atingiu um valor de 695 m³/s, aproximadamente 41% acima da média para este mês (492 m3/s), o que não ocorria há muito nesta bacia. De acordo com as projeções hidrológicas para o período de dezembro de 2018 a fevereiro de 2019, mostradas na Figura 2, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente poderá atingir cerca de 90% da média histórica (MLT[3]: 1983-2017).
Reservatório de Serra da Mesa, Sistema Araguaia-Tocantins
Na Região Centro-Oeste, no mês de novembro (até o dia 28), a vazão média afluente ao reservatório de Serra da Mesa, bacia de cabeceira do Rio Tocantins, foi de 510 m³/s, aproximadamente 9% acima da média histórica para este mês (469 m3/s). Segundo as projeções hidrológicas para o período dezembro de 2018 a fevereiro de 2019, apresentadas na Figura 3, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente ficará em torno de 85% da média histórica (MLT: 1983-2017).
Figura 2 – Cenários de vazão natural média mensal (m³/s) ao reservatório de Três Marias, de novembro/2018 a março/2019. | Figura 3 – Cenários de vazão natural média mensal (m³/s) ao reservatório de Serra da Mesa, de novembro/2018 a março/2019. |
Projeções das Reservas Hídricas de Açudes Monitorados do Semiárido Brasileiro
O reservatório Castanhão (Ceará), o maior da Região Nordeste, operou com 5,0% de seu volume útil no dia 22 de novembro de 2018 (Figura 4), situação ligeiramente melhor (menos crítica) que no mesmo período de 2017 (3,8%). As projeções indicam que o volume armazenado nesse reservatório, de modo geral, deverá se manter estável, podendo atingir cerca de a 5,3% de sua capacidade no final de fevereiro de 2019. O reservatório Epitácio Pessoa/Boqueirão (Paraíba) operou com 25,2% de seu volume útil no dia 24 de novembro de 2018 (Figura 5), situação melhor que no mesmo período de 2017 (9,2%). As projeções indicam que, mantendo-se as extrações atuais e a suspensão dos aportes da transposição do Rio São Francisco, o armazenamento de água diminuirá, podendo chegar a 20,7% de sua capacidade no final de janeiro de 2019. Ressalta-se que estes cenários podem ser alterados devido a mudanças na vazão da transposição e/ou na extração de água para o abastecimento público. A transposição das águas do rio São Francisco para o Estado da Paraíba, pelo eixo leste, temporariamente suspensa desde abril de 2018 devido a obras que estão sendo realizadas nos reservatórios de Camalaú e Poções, voltou a operar em outubro de 2018, entretanto, ainda sem previsão de chegada das águas ao reservatório Epitácio Pessoa/Boqueirão.
Figura 4 – Projeção da evolução do volume armazenado (%) no reservatório Castanhão para o trimestre DJF/2019. | Figura 5 – Projeção da evolução do volume armazenado (%) no reservatório Boqueirão para trimestre DJf/2019. |
IMPACTOS NA VEGETAÇÃO E AGRICULTURA DE SEQUEIRO
Projeção dos Impactos da Seca em todo o Brasil no Trimestre DJF/2019
Considerando o Índice Integrado de Seca[4] (IIS), as condições de seca de intensidade moderada e severa poderão permanecer principalmente nos Estados de Alagoas e Sergipe, mesmo num cenário de chuvas dentro da normal climatológica para o trimestre DJF/2019 (Figura 6), como resultado dos escassos volumes pluviométricos observados em ambos. Neste cenário, a porcentagem de área impactada (em relação à área total) poderá atingir 7,2% na Região Nordeste (principalmente na porção leste), 0,8% da Região Sul (principalmente no oeste do Paraná), 0,5% da Região Sudeste (principalmente no noroeste do Estado de São Paulo), 0,7% da Região Norte e 1,1 da Região Centro-Oeste. Por outro lado, num cenário de chuvas 20% abaixo da normal climatológica, os percentuais de áreas impactadas poderão aumentar para 14% na Região Nordeste (porções norte e leste) e 4,1% na Região Norte (principalmente no Amazonas). Tais cenários podem indicar aumento da ocorrência de queimadas, principalmente na Região Norte, bem como perda da produtividade nas áreas onde o calendário agrícola encontra-se em sua fase crítica.
Figura 6 – Cenários de possíveis impactos da seca em todo o Brasil para o trimestre DJF/2019.
Projeção dos Impactos da Seca na Agricultura Familiar de Sequeiro
A produção agrícola no Nordeste do Brasil e norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo (área de atuação da SUDENE) é predominantemente formada por agricultura familiar, sendo a maior parte constituída de plantios em sistema de sequeiro, caracterizada por baixos índices de produtividade. O calendário de plantio está diretamente associado ao início da estação chuvosa em cada sub-região. Entre os meses de outubro a dezembro, ocorre o período de plantio na área destacada na Figura 7, que inclui parte da Bahia e norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Segundo as projeções do Índice Integrado de Seca (IIS) – que considera dados atualizados de sensoriamento remoto e projeções de chuva – num cenário com chuvas 20% abaixo da média para os meses de dezembro a fevereiro, 27 municípios, em sua maioria localizados na parte leste do Estado da Bahia, poderão apresentar queda na produtividade agrícola e/ou pecuária. Isso ocorrerá em razão da atual condição de estresse hídrico no solo desses municípios. Já para um cenário com chuvas na média e 20% abaixo da média, o número de municípios diminuiria para 3 e 1, respectivamente.
Figura 7 – Cenários de possíveis impactos da seca na agricultura de sequeiro no trimestre DJF/2019. A área delimitada pela linha magenta indica os municípios cujo calendário de plantio ocorre entre os meses de outubro e dezembro.
NOTAS EXPLICATIVAS
Índice Integrado de Seca (IIS)
O Índice Integrado de Seca (IIS) consiste na combinação do Índice de Precipitação Padronizada (SPI) com o Índice de Suprimento de Água para a Vegetação (VSWI) ou com o Índice de Saúde da Vegetação (VHI), ambos estimados por sensoriamento remoto. O SPI é um índice amplamente utilizado para detectar a seca meteorológica em diversas escalas e pode ser interpretado como o número de desvios padrões nos quais a observação se afasta da média climatológica. O índice negativo representa condições de déficit hídrico, nas quais a precipitação é inferior à média climatológica. O índice positivo representa condições de excesso hídrico, que indicam precipitação superior à média histórica. Para integrar o IIS, o SPI é calculado a partir de dados observacionais de precipitação disponíveis no CEMADEN, no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Centros Estaduais de Meteorologia.
Índice de Suprimento de Água para a vegetação (VSWI)
O VSWI é calculado a partir do Índice de Vegetação da Diferença Normalizada (NDVI, sigla em inglês) e da temperatura da superfície, ambos do sensor MODIS a bordo dos satélites Terra e Aqua, disponibilizadas pelo Earth Observing System (EOS/NASA). O VSWI indica condição de seca quando o valor do NDVI é baixo (baixa atividade fotossintética) e a temperatura da vegetação é alta (estresse hídrico). Portanto, o índice é inversamente proporcional ao conteúdo de umidade do solo e fornece uma indicação indireta do suprimento de água para a vegetação.
Índice de Saúde da Vegetação (VHI)
O VHI é calculado a partir do Índice de Condição da Vegetação (VCI) e Índice da Condição da Temperatura (TCI). O VCI é a normalização do NDVI, utilizado para avaliar se a densidade da vegetação está maior ou menor que o normal. O VCI não reflete apenas a variabilidade espacial e temporal da vegetação, mas também permite quantificar o impacto dos eventos extremos na vegetação. O TCI é considerado um indicador de estresse térmico. A umidade do solo é reduzida em um evento de seca, causando estresse térmico na vegetação. O TCI permite identificar mudanças sutis na saúde da vegetação devido a efeitos térmicos. À medida que a seca se intensifica, a umidade do solo é reduzida causando o aumento da temperatura de brilho.
Para a compilação do IIS, os dados de SPIs, na escala 6 meses, e o VSWI ou VHI são reclassificados e compatibilizados de forma que as classes de ambos os índices traduzam as mesmas intensidades de seca, as quais variam de fraca à excepcional. O IIS é calculado na escala mensal e apresentado com diferentes classes para as intensidades de seca.
Coordenador Responsável: José A. Marengo
Revisor Científico desta Edição: José A. Marengo
Colaboradores: Adriana Cuartas, Ana Paula Cunha, Anna Bárbara Coutinho de Melo, Elisângela Broedel, Germano Neto, Karinne Leal, Marcelo Seluchi
[1] O PDM/Cemaden é um modelo probabilístico baseado na umidade do solo e utiliza como entradas a precipitação e a evapotranspiração potencial para estimar a vazão.
[2] Para mais informações no que se refere à elaboração das projeções hidrológicas, consultar a Website do Cemaden:
http://www2.cemaden.gov.br/categoria/monitoramento/monitoramento-hidrologico/relatoriocantareira/
[3] A sigla MLT significa Média de Longo Termo ou, em outras palavras, média que representa a situação observada por longo período, geralmente igual ou maior que 30 anos.
[4] Explicações mais detalhadas acerca da metodologia utilizada para o cálculo do Índice Integrado de Seca (IIS) estão descritas no final desta edição.