SUMÁRIO
A presente edição do Boletim Mensal de Impactos em Atividades Estratégicas para o Brasil, elaborado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), apresenta os cenários mais prováveis de impactos de eventos extremos em diferentes setores produtivos do Brasil. Isso inclui o diagnóstico (Março/2020) e projeção (Abril/2020) do Índice Integrado de Seca (IIS) para todo o Brasil, avaliação dos impactos da seca na agricultura familiar de sequeiro e previsão de impactos nos recursos hídricos para o trimestre abril-maio-junho de 2020 (AMJ 2020). Em particular, são abordadas a situação atual e as projeções de vazões afluentes aos reservatórios do Sistema Cantareira, Três Marias e Serra da Mesa, bem como o cenário esperado para o volume armazenado da Bacia do Rio Amazonas na região Norte do país, no decorrer do referido trimestre.
A situação de armazenamento no Sistema Cantareira em 31 de março de 2020 (64,4%) é melhor quando comparada à situação de 31 de março de 2019 (55,2%). Em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, o modelo hidrológico projeta uma média de vazão afluente, aproximadamente, de 75% em relação à Média de Longo Termo (MLT[1]) no trimestre AMJ. Considerando este mesmo cenário hipotético de chuvas, o armazenamento no final de junho de 2020 poderá atingir 59%, situação semelhante ao mesmo período do ano anterior (55% de armazenamento). Para as bacias afluentes aos reservatórios de Três Marias e Serra da Mesa, o modelo hidrológico projeta uma média de vazão em torno de 104% e 111% da MLT, respectivamente, situação mais otimista em comparação ao trimestre AMJ de 2019 (73% e 91% da MLT, respectivamente).
[1] A sigla MLT significa Média de Longo Termo ou, em outras palavras, média que representa a situação observada por longo período, geralmente igual ou maior que 30 anos.
O IIS observado no mês de março aponta para a intensificação da seca na Região Sul do país e no Estado do Mato Grosso do Sul, variando de moderada à extrema. O cenário do IIS para o mês de abril, considerando chuva 30% abaixo da média, indica intensificação das condições de seca em toda a região Sul e no estado do Mato Grosso do Sul, enquanto o cenário do IIS para o mês de abril considerando chuva 30% acima da média aponta para uma atenuação das condições de seca em grande parte do país.
Na Bacia do Rio Amazonas, o rio Madeira (Porto Velho) entrou em seu período de vazante. Os Rios Solimões e Negro estão com tendência de vazões acima do normal para meados do final de maio.
IMPACTOS EM HIDROLOGIA
Evolução do Armazenamento no Sistema Cantareira
O Sistema Cantareira – sistema que abastece parte da região metropolitana de São Paulo – atingiu 64,4% de seu volume útil em 31 de março de 2020 (Figura 1), valor superior ao observado no mesmo período de 2019 (55,2%). No mês de março, a precipitação foi 96,4 mm, o que corresponde a 54% da climatologia. A média de vazão afluente aos reservatórios do Sistema Cantareira foi de 42,3 m³/s, representando 71% da média histórica do mês.
Em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, o modelo hidrológico PDM/Cemaden[2] projeta uma vazão afluente de, aproximadamente, 75% da média histórica para o trimestre AMJ/2020. Ainda considerando este mesmo cenário de chuvas e a interligação com a bacia do rio Paraíba do Sul, o volume útil armazenado poderá atingir valores em torno de 59% em 30 de junho de 2020, situação semelhante quando comparada ao mês de junho de 2019 (55% de armazenamento), finalizando o trimestre AMJ na faixa “Atenção”. Para maiores informações, consulte o Boletim da Situação atual e projeção hidrológica para o Sistema Cantareira – Abril de 2020 (https://www2.cemaden.gov.br/situacao-atual-e-projecao-hidrologica-para-o-sistema-cantareira-31032020/).
[2] O PDM/Cemaden é um modelo probabilístico baseado na umidade do solo e utiliza como entradas a precipitação e a evapotranspiração potencial para estimar a vazão.
Reservatório de Três Marias, Bacia do Rio São Francisco
Na bacia de Três Marias, no alto São Francisco, a precipitação foi de 160 mm em março de 2020, correspondente a 94% da média climatológica (1983-2019: 171 mm). A vazão média afluente nesta bacia atingiu o valor de 1.642 m³/s, aproximadamente, 54% acima da média para o mês de março (1.068 m3/s). O armazenamento no reservatório de Três Marias atingiu 99,5% em 31 de março de 2020, valor superior ao período de 31 de março de 2019 (76,5%).
De acordo com as projeções hidrológicas para o trimestre AMJ de 2020, apresentadas na Figura 2, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente poderá atingir cerca de 4% acima da média histórica (464 m³/s), sendo essa situação mais favorável em comparação ao trimestre AMJ de 2019 (73% da MLT). Adicionalmente, em um cenário de precipitação na média climatológica e considerando uma vazão defluente média igual a 650 m3/s para o período de abril a junho de 2020, o reservatório poderá atingir valores de, aproximadamente, 90% do volume útil no final de junho de 2020. Maiores informações podem ser encontradas no Boletim da Situação Atual e Projeção Hidrológica para o Reservatório Três Marias – Abril de 2020 (https://www2.cemaden.gov.br/categoria/monitoramento/monitoramento-hidrologico/relatoriotresmarias/).
Reservatório de Serra da Mesa, Sistema Araguaia-Tocantins
Na bacia afluente a usina hidrelétrica Serra da Mesa, no alto do Rio Tocantins, em março de 2020, a precipitação foi 312 mm, correspondente a 47% acima da média climatológica. Sua vazão média afluente foi 1.784 m³/s, valor 43% superior à média histórica para o mês de março, e o reservatório operou com 28,2% de armazenamento em 31 de março de 2020.
Segundo as projeções hidrológicas para o trimestre AMJ de 2020, apresentadas na Figura 3, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente ficará em torno de 11% acima da média histórica do período, situação mais favorável que no trimestre AMJ de 2019 (91% da MLT).
Considerando um cenário de chuvas na média climatológica para o próximo trimestre e considerando uma vazão defluente igual a 100 m³/s para abril e igual a 300 m³/s para maio e junho, o reservatório poderá atingir 33% do volume útil no final de junho de 2020. Maiores informações podem ser encontradas no Boletim da Situação Atual e Projeção Hidrológica para o Reservatório Serra da Mesa – Abril de 2020 (https://www2.cemaden.gov.br/situacao-atual-e-projecao-hidrologica-para-o-reservatorio-de-serra-da-mesa-bacia-do-rio-tocantins-07042020/).
Projeções de Vazão para a Bacia do Rio Amazonas
O Rio Madeira atingiu a cota de 15,99 metros no dia 03 de março, passando ao estágio de alerta (16 metros). Entretanto, nos dias seguintes, o nível do Madeira apresentou gradativa redução até meados do dia 20 de março, quando voltou a apresentar leve aumento, mas sem ultrapassar a cota de 15,24 metros. A previsão estendida até junho de 2020 (Figura 4), aponta o período de vazante.
Até meados do final de abril o nível do Rio Madeira tende a ficar abaixo média (linha pontilhada) e a partir de maio, a cota observada deve permanecer na média climatológica. Por outro lado, o Rio Solimões (Figura 5), próximo ao ponto de confluência com o Rio Negro, está evoluindo para vazões acima do normal para esta época do ano, principalmente a partir de meados do dia 20 de maio.
Por ser de grande porte, o Rio Solimões regula o nível em Manaus por efeito de remanso e por esse motivo merece ser acompanhado durante os próximos meses.
IMPACTOS NA VEGETAÇÃO E AGRICULTURA
Índice Integrado de Seca (IIS): observado para o mês de março de 2020 e projeção para o mês de abril de 2020 em todo o Brasil
De acordo com o Índice Integrado de seca (IIS) para o mês de março (Figura 6a), houve intensificação da seca na Região Sul do país e no Estado do Mato Grosso do Sul, variando de moderada à extrema. De acordo com os dados da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) e Emater-RS, nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul ocorreram perdas significativas na agricultura, sobretudo na produção de soja e de milho, devido à escassez de chuvas e altas temperaturas.
Em Santa Catarina, as regiões de Curitibanos e Campos de Lages (situadas na área com as maiores intensidades de seca do estado) apresentaram redução de cerca de 25% e 26% na produtividade do milho e de 12% e 13% na produtividade da soja, respectivamente (Boletim Agropecuário Epagri/Cepa de março de 2020). No Rio Grande do Sul, também houve grandes perdas nas culturas de soja e milho, em diversas regiões. Destacam-se as perdas superiores a 50% na produtividade da soja, na região de Santa Maria, e de 47% na produtividade do milho, na região de Soledade. Neste contexto, muitos produtores do estado foram prejudicados e têm recorrido à assistência de seguros agrícolas ou do Proagro (Programa de Garantia da Atividade Agropecuária), segundo a Emater/RS-Ascar.
Em cenário mais crítico, considerando chuvas 30% abaixo da média (Figura 6b), o IIS para o mês de abril de 2020, indica para a região norte, condições de seca moderada e severa nos estados do Amazonas, Roraima e Amapá. Para a região Centro-Oeste indica intensificação das condições de seca no estado do Mato Grosso do Sul e para a região Sul, permanência das condições de secas nos três estados, com intensidade variando entre moderada a extrema. Por outro lado, em cenário considerando chuvas acima de 30% da média (Figura 6c), o IIS para o mês de abril aponta para atenuação das condições de seca em grande parte do país, mas ainda com ocorrência de seca moderada e severa, no Estado do Mato Grosso do Sul, e de seca moderada à extrema, no Rio Grande do Sul.
Impactos da seca na produção agrícola de sequeiro
Os municípios apresentados na Figura 7, são aqueles, cujos calendários de plantio e colheita compreendem os meses de dezembro a julho na região do semiárido brasileiro.
Segundo as projeções do IIS para o mês de abril/2020 – que considera dados atualizados de sensoriamento remoto e projeções de chuva – em um cenário com chuva 30% inferior à média histórica (Figura 7b), apenas 1 município deve apresentar condição de seca severa e 13 devem apresentar condição de seca moderada. A maioria destes municípios está localizada no estado do Maranhão.
Em um cenário, considerando chuva 30% acima da média climatológica (Figura 7c), a estimativa é de apenas 2 municípios com condição de seca moderada. Ressalta-se que essa região tem calendário agrícola vigente e encontra-se no seu período chuvoso, portanto é esperada a melhoria na condição de seca em relação aos meses anteriores. Assim, não se espera situação de déficit hídrico que possa impactar na produção agrícola de sequeiro nessas regiões.
Para a região Sul, o IIS projetado para o mês de abril considerando ambos os cenários de chuvas (abaixo e acima) mostra condição de déficit hídrico intenso na maior parte dos municípios da região (Figura 8). Tal cenário reflete a falta de chuva ocorrida nos últimos meses bem como as temperaturas mais elevadas. As condições de seca projetadas para o mês de abril, se mantidas, podem impactar a produtividade do feijão 3a safra e milho 2a safra, cujo período de plantio e desenvolvimento se encontram vigentes.
CONDIÇÕES DE SECAS E IMPACTOS: MARÇO/2020
CONDIÇÕES DE SECAS E IMPACTOS: CENÁRIOS
NOTAS EXPLICATIVAS
Índice Integrado de Seca (IIS)
O Índice Integrado de Seca (IIS) consiste na combinação do Índice de Precipitação Padronizada (SPI) com o Índice de Suprimento de Água para a Vegetação (VSWI) ou com o Índice de Saúde da Vegetação (VHI), ambos estimados por sensoriamento remoto. O SPI é um índice amplamente utilizado para detectar a seca meteorológica em diversas escalas temporais e pode ser interpretado como o número de desvios padrões nos quais a observação se afasta da média climatológica. Um valor negativo de SPI representa condições de déficit hídrico, nas quais a precipitação é inferior à média climatológica. Um valor positivo de SPI representa condições de excesso hídrico, que indicam precipitação superior à média histórica. Para integrar o IIS, o SPI é calculado a partir de dados observacionais de precipitação disponíveis no CEMADEN, no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Centros Estaduais de Meteorologia.
Para a compilação do IIS, os dados de SPIs, na escala de 6 meses, e o VSWI ou VHI são reclassificados e compatibilizados de forma que as classes de ambos os índices traduzam as mesmas intensidades de seca, as quais variam de fraca à excepcional. O IIS é calculado mensalmente e apresentado com diferentes classes para as intensidades de seca.
Índice de Suprimento de Água para a vegetação (VSWI)
O VSWI é calculado a partir do Índice de Vegetação da Diferença Normalizada (NDVI, sigla em inglês) e da temperatura da superfície, ambos do sensor MODIS a bordo dos satélites Terra e Aqua, disponibilizadas pelo Earth Observing System (EOS/NASA). O VSWI indica condição de seca quando o valor do NDVI é baixo (baixa atividade fotossintética) e a temperatura da vegetação é alta (estresse hídrico). Portanto, o índice é inversamente proporcional ao conteúdo de umidade do solo e fornece uma indicação indireta do suprimento de água para a vegetação.
Índice de Saúde da Vegetação (VHI)
O VHI é calculado a partir do Índice de Condição da Vegetação (VCI) e do Índice da Condição da Temperatura (TCI). O VCI é a normalização do NDVI, utilizado para avaliar a densidade da vegetação em relação às condições padrões, permitindo verificar a variabilidade espacial e temporal das condições da vegetação, assim como quantificar o impacto dos eventos extremos. O TCI é considerado um indicador de estresse térmico. A umidade do solo é reduzida em um evento de seca, causando estresse térmico na vegetação. O TCI permite identificar mudanças sutis na saúde da vegetação devido a efeitos térmicos. À medida que a seca se intensifica, a umidade do solo é reduzida causando o aumento da temperatura de brilho.
Coordenador Responsável: José A. Marengo
Revisor Científico desta Edição: José A. Marengo
Colaboradores: Adriana Cuartas, Ana Paula Cunha, Ana Paula dos Santos, Conrado Rudorff, Daniela França, Elisângela Broedel, Fabiani Bender, Karinne Deusdará-Leal, Lidiane Costa, Marcelo Seluchi, Marcelo Zeri, Márcio Moraes, Rafael Luiz, Valesca Fernandes, Vinicius Sperling
1. Os relatórios com informações mais detalhadas sobre a situação atual das principais reservas hídricas e condições de seca em todo o País, bem como as projeções hidrológicas e possíveis cenários de impactos da seca, encontram-se disponíveis e atualizados no Website do Cemaden (https://www2.cemaden.gov.br).
2. As informações/produtos apresentados não podem ser usados para fins comerciais, copiados integral ou parcialmente para a reprodução em meios de divulgação, sem a expressa autorização do Cemaden/MCTIC e dos demais órgãos com os quais o Cemaden mantém parcerias. Os usuários deverão sempre mencionar a fonte das informações/dados da instituição como sendo do Cemaden/MCTIC. Ressaltamos que a geração e a divulgação das informações/produtos consideram critérios de qualidade e consistência dos dados.
3. Registramos, ainda, que os dados da rede de monitoramento de desastres naturais disponibilizados via Mapa Interativo no website do Cemaden não passaram por nenhum tratamento, portanto poderá haver inconsistências nesses dados.