SUMÁRIO
Na terceira edição do boletim mensal de previsão de impactos em atividades estratégicas para o Brasil, o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), apresenta os cenários mais prováveis de impactos nos recursos hídricos e na vegetação, em diferentes setores do Brasil, bem como na agricultura familiar de sequeiro para o semiárido, no decorrer do trimestre outubro-novembro-dezembro de 2018 (OND/2018). Ainda são destaques neste boletim: a atual situação do Sistema Cantareira, com projeções que refletem a baixa pluviosidade nos meses anteriores; as vazões afluentes aos reservatórios de Três Marias e Serra da Mesa; bem como os possíveis cenários para os volumes armazenados nos açudes monitorados no semiárido da Região Nordeste, nos meses subsequentes.
Na avalição dos cenários em hidrologia, a vazão do Sistema Cantareira dificilmente atingirá valores médios no período OND/2018, em função da baixa pluviosidade nos meses anteriores. Desta forma, segundo o modelo hidrológico, o volume armazenado poderá ficar em situação mais desfavorável que em dezembro de 2017, considerando a interligação. Já para as sub-bacias de Serra da Mesa e Três Marias, as vazões poderão ficar em situação mais favorável que no mesmo período do ano anterior. Em dois grandes reservatórios da Região Nordeste, Castanhão (Ceará) e Epitácio Pessoa (Paraíba), os volumes armazenados também ficarão em situação mais favorável que em dezembro de 2017.
Considerando os impactos na agricultura familiar de sequeiro, mesmo num cenário de chuvas dentro da média climatológica, 47 municípios ainda permanecem com possibilidade de redução da produtividade agrícola. Estes municípios estão inseridos na área cujo calendário de plantio vai de outubro a novembro e que abrange parte da Bahia e norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo.
IMPACTOS EM HIDROLOGIA
Evolução do Armazenamento no Sistema Cantareira
O monitoramento do Sistema Cantareira – sistema que abastece parte da região metropolitana de São Paulo – mostrou que seu volume útil atingiu 34,8% em 19 de setembro de 2018 (Figura 1), valor inferior ao observado no mesmo período de 2017 (50,6%). Em um cenário de chuvas dentro da média, o modelo hidrológico PDM/Cemaden[1] sugere que a vazão neste sistema não atingirá os valores médios no próximo trimestre. Ainda considerando este mesmo cenário de chuvas, o volume útil armazenado poderá atingir valores em torno de 34,6% no final do dezembro e com 58,5% no final do período chuvoso, em 31 de março de 2019. Esta simulação[2] considerou: (i) vazões afluentes simuladas pelo modelo hidrológico PDM/Cemaden; (ii) vazões defluentes para a bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí iguais às médias praticadas entre os anos de 2014 e 2016 (jul-out =2,09 m³/s e nov-mar = 1,55 m³/s); (iii) vazão de extração para o Elevatório Santa Inês (abastecimento de São Paulo) de acordo com a resolução conjunta ANA/DAEE Nº 925; e (iv) interligação com a bacia do Rio Paraíba do Sul com vazão média de 5,13 m³/s, de acordo com a resolução ANA Nº 1931.
Reservatório de Três Marias, Bacia do Rio São Francisco.
No mês de setembro (até o dia 19), a vazão média afluente ao reservatório de Três Marias, no alto São Francisco, foi de 52 m³/s, aproximadamente 26% da média para este mês. De acordo com as projeções hidrológicas para o período setembro a dezembro, mostradas na Figura 2, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente poderá atingir cerca de 68% da média histórica (MLT[3]: 1983-2017).
Reservatório de Serra da Mesa, Sistema Araguaia-Tocantins.
Na Região Centro-Oeste, no mês de setembro (até o dia 19), a vazão média afluente ao reservatório de Serra da Mesa, bacia de cabeceira do Rio Tocantins, foi de 99 m³/s, aproximadamente 52% da média histórica para este mês. Segundo as projeções hidrológicas para o período setembro a dezembro, apresentadas na Figura 3, num cenário de chuvas na média climatológica, a vazão afluente ficará em torno de 75% da média histórica (MLT: 1983-2017).
Figura 2 – Cenários de vazão natural média mensal (m³/s) ao reservatório de Três Marias, de setembro/2018 a março/2019. | Figura 3 – Cenários de vazão natural média mensal (m³/s) ao reservatório de Serra da Mesa, de setembro/2018 a março/2019. |
Projeções das Reservas Hídricas de Açudes Monitorados do Semiárido Brasileiro
O reservatório Castanhão (Ceará), o maior da Região Nordeste, operou com 6,4% de seu volume útil no dia 19 de setembro de 2018 (Figura 4), situação menos crítica que no mesmo período de 2017 (4,2%). As projeções indicam que o volume armazenado diminuirá, podendo chegar a 4,9% de sua capacidade no final de dezembro de 2018. O reservatório Epitácio Pessoa/Boqueirão (Paraíba) operou com 28,6% de seu volume útil no dia 19 de setembro de 2018 (Figura 5), situação melhor que no mesmo período de 2017 (8,5%). As projeções indicam que, mantendo-se as extrações atuais e a suspensão dos aportes do Rio São Francisco, o armazenamento de água diminuirá podendo chegar a 27,6% de sua capacidade no final de dezembro de 2018. Ressalta-se que estes cenários podem ser alterados devido a mudanças na vazão da transposição e/ou na extração de água para o abastecimento público. A transposição das águas do rio São Francisco para o Estado da Paraíba, pelo eixo leste, está temporariamente suspensa desde abril de 2018, devido a obras que estão sendo realizadas nos reservatórios de Camalaú e Poções, na região do Cariri deste Estado. De acordo com o Ministério Público Federal e Ministério Público da Paraíba, por meio do Comitê Gestor de Crise Hídrica, as obras devem ser finalizadas até o dia 30 de setembro de 2018.
Figura 4 – Projeção da evolução do volume armazenado (%) no reservatório Castanhão para o trimestre OND/2018. | Figura 5 – Projeção da evolução do volume armazenado (%) no reservatório Boqueirão para trimestre OND/2018. |
IMPACTOS NA VEGETAÇÃO E AGRICULTURA DE SEQUEIRO
Projeção dos Impactos da Seca em todo o Brasil no Trimestre OND/2018
Considerando o Índice Integrado de Seca[4] (IIS), as condições de seca de intensidade moderada à extrema poderão permanecer mesmo num cenário de chuvas dentro da normal climatológica para o trimestre OND/2018 (Figura 6). Neste cenário, a porcentagem de área impactada (em relação à área total) poderá atingir 12% na Região Nordeste (principalmente na porção leste), 4% da Região Sul (principalmente em Santa Catarina e no Paraná), 1% da Região Sudeste (principalmente no noroeste do Estado de São Paulo), 1,3% da Região Norte e 1,1% na Região Centro-Oeste. Por outro lado, num cenário de chuvas 20% abaixo da normal climatológica, os percentuais de áreas impactadas poderão aumentar para 16,3% na Região Nordeste (porções norte e leste) e 10,7% na Região Sul (principalmente no Paraná). A área impactada por condição de seca moderada à extrema poderá chegar a 5,1%, 5,6% e 7,3% nas Regiões Norte (principalmente no Amazonas e Acre), Sudeste (noroeste de São Paulo) e Centro-Oeste, respectivamente. Tais cenários podem indicar aumento da ocorrência de queimadas, principalmente na Região Norte, bem como perda da produtividade nas áreas onde o calendário agrícola encontra-se em sua fase crítica.
Figura 6 – Cenários de possíveis impactos da seca em todo o Brasil para o trimestre OND/2018.
Projeção dos Impactos da Seca na Agricultura Familiar de Sequeiro
A produção agrícola no Nordeste do Brasil e norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo (área de atuação da SUDENE) é predominantemente formada por agricultura familiar, sendo a maior parte constituída de plantios em sistema de sequeiro, caracterizada por baixos índices de produtividade. O calendário de plantio está diretamente associado ao início da estação chuvosa em cada sub-região. Entre os meses de outubro a novembro, tem início o período de plantio na área destacada na Figura 7, que inclui parte da Bahia e norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Segundo as projeções do Índice Integrado de Seca (IIS) – que considera dados atualizados de sensoriamento remoto e projeções de chuva – num cenário com chuvas dentro da climatologia para os meses de outubro a dezembro, 47 municípios ( localizados em sua maioria na parte leste) poderão apresentar queda na produtividade agrícola e/ou pecuária. Isso poderá ocorrer em razão da condição atual de estresse hídrico do solo nesses municípios. Para um cenário mais pessimista (chuva 20% abaixo da média), este número pode chegar a 237 municípios.
Figura 7 – Cenários de possíveis impactos da seca na agricultura de sequeiro no trimestre OND/2018. A área delimitada pela linha magenta indica os municípios cujo calendário de plantio inicia entre os meses de outubro e novembro.
NOTAS EXPLICATIVAS
Índice Integrado de Seca (IIS)
Índice Integrado de Seca (IIS) consiste na combinação do Índice de Precipitação Padronizada (SPI) com o Índice de Suprimento de Água para a vegetação (VSWI), este estimado por sensoriamento remoto. O SPI é um índice amplamente utilizado para detectar a seca meteorológica em diversas escalas e pode ser interpretado como o número de desvios padrões nos quais a observação se afasta da média climatológica. O índice negativo representa condições de déficit hídrico, nas quais a precipitação é inferior à média climatológica. O índice positivo representa condições de excesso hídrico, que indicam precipitação superior à média histórica. Para integrar o IIS, o SPI é calculado a partir de dados observacionais de precipitação disponíveis no CEMADEN, no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Centros Estaduais de Meteorologia.
Índice de Suprimento de Água para a vegetação (VSWI)
O VSWI é calculado a partir do Índice de Vegetação da Diferença Normalizada (NDVI, sigla em inglês) e da temperatura da superfície, ambos do sensor MODIS a bordo dos satélites Terra e Aqua, disponibilizadas pelo Earth Observing System (EOS/NASA). O VSWI indica condição de seca quando o valor do NDVI é baixo (baixa atividade fotossintética) e a temperatura da vegetação é alta (estresse hídrico). Portanto, o índice é inversamente proporcional ao conteúdo de umidade do solo e fornece uma indicação indireta do suprimento de água para a vegetação. Para a compilação do IIS, os dados de SPIs nas escalas 6 meses e o VSWI são reclassificados e compatibilizados de forma que as classes de ambos os índices traduzam nas mesmas intensidades de seca, as quais variam de fraca à excepcional. O IIS é calculado na escala mensal e apresentado com diferentes classes para as intensidades de seca.
Coordenador Responsável: José A. Marengo
Revisor Científico desta Edição: Adriana Cuartas
Colaboradores: Adriana Cuartas, Ana Paula Cunha, Anna Bárbara Coutinho de Melo, Claudinei de Camargo, Eliana Andrade, Elisângela Broedel, Germano Neto, Karinne Leal, Marcelo Seluchi, Rong Zhang
[1] O PDM/Cemaden é um modelo probabilístico baseado na umidade do solo e utiliza como entradas a precipitação e a evapotranspiração potencial para estimar a vazão.
[2] Para mais informações no que se refere à elaboração das projeções hidrológicas, consultar a Website do Cemaden:
http://www2.cemaden.gov.br/categoria/monitoramento/monitoramento-hidrologico/relatoriocantareira/
[3] A sigla MLT significa Média de Longo Termo ou, em outras palavras, média que representa a situação observada por longo período, geralmente igual ou maior que 30 anos.
[4] Explicações mais detalhadas acerca da metodologia utilizada para o cálculo do Índice Integrado de Seca (IIS) estão descritas no final desta edição.