SUMÁRIO
Nesta edição do boletim mensal de previsão de impactos em atividades estratégicas para o Brasil, elaborado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), são mostrados os cenários mais prováveis de impactos nos recursos hídricos e na vegetação, em diferentes setores do Brasil, bem como na agricultura familiar de sequeiro para o semiárido, no decorrer do trimestre abril, maio e junho de 2019 (AMJ/2019). Também são abordadas a situação atual e as projeções de vazões afluentes aos reservatórios do Sistema Cantareira, Três Marias e Serra da Mesa, bem como os possíveis cenários para os volumes armazenados nos açudes monitorados no semiárido da Região Nordeste: Castanhão e Boqueirão, no decorrer do referido trimestre. São apresentadas, ainda, as previsões de vazão para o rio Madeira.
A situação de armazenamento do reservatório do Sistema Cantareira (55,2%), em 31 de março, é similar à situação do ano anterior. Em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, o modelo hidrológico projeta que a vazão afluente ficará abaixo da média no decorrer do próximo trimestre (70% da MLT) e o armazenamento no sistema poderá chegar a junho de 2019 em situação mais favorável, quando comparada ao mesmo período de 2018, na mesma faixa de operação e, portanto, com o mesmo valor máximo potencial a ser extraído. Já para a bacia afluente ao reservatório Três Marias, o modelo hidrológico projeta uma vazão em torno de 77% da Média de Longo Termo (MLT), situação mais favorável quando comparada ao mesmo trimestre AMJ/2018. Para a bacia afluente ao reservatório Serra da Mesa, o modelo hidrológico projeta uma vazão próxima a 84% da MLT, situação semelhante ao apresentado no trimestre AMJ/2018. Para a bacia do rio Madeira, na Região Norte, as vazões estão abaixo do nível de inundação e as projeções indicam um leve aumento nos próximos dias, porém o rio encontra-se em processo de vazante.
De acordo com o Índice Integrado de Seca (IIS), considerando um cenário de chuva 20% abaixo do esperado para o trimestre AMJ, os Estados de São Paulo, Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul podem ser os mais afetados por condições de seca. No cenário em que a precipitação acumulada para o próximo trimestre atingisse 20% acima da média climatológica, ocorreria uma atenuação das condições de seca em todo o Brasil, apenas persistindo condição de seca fraca em sua grande parte. Com relação à agricultura de sequeiro, para os municípios inseridos no sul dos Estados do Maranhão e Piauí, há possibilidade de queda da produção agrícola de sequeiro para ambas as condições climáticas.
IMPACTOS EM HIDROLOGIA
Evolução do Armazenamento no Sistema Cantareira
O Sistema Cantareira – sistema que abastece parte da região metropolitana de São Paulo – atingiu 55,2% de seu volume útil em 31 de março de 2019 (Figura 1), valor semelhante ao observado no mesmo período de 2018 (54,2%). A vazão média afluente aos reservatórios do Sistema Cantareira atingiu o valor de 51 m³/s, aproximadamente 84% da média para o mês de março (60 m3/s). Nesta bacia, a precipitação foi de 170 mm em março de 2019, representando um valor de 95% da climatologia (1983-2018: 179 mm). Mesmo em um cenário de chuvas na média, o modelo hidrológico PDM/Cemaden[1] projeta que a vazão afluente média para o trimestre AMJ será em torno de 70% da MLT. Ainda considerando este mesmo cenário de chuvas, o volume útil armazenado poderá atingir valores em torno de 54% em 30 de junho de 2019, considerando a interligação com a bacia do rio Paraíba do Sul. Se essa interligação fosse desconsiderada, o volume útil poderia atingir valores em torno de 50%. Com este nível de armazenamento, a extração de água máxima permitida para o elevatório Santa Inês é de 31 m³/s. Esta simulação[2] considerou: (i) vazões afluentes simuladas pelo modelo hidrológico PDM/Cemaden; (ii) vazões defluentes para a bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí iguais às médias praticadas entre os anos de 2014 e 2016 (nov-mar = 1,55 m³/s); (iii) vazão de extração para o Elevatório Santa Inês (abastecimento de São Paulo) de acordo com a resolução conjunta ANA/DAEE Nº 925; e (iv) interligação com a bacia do Rio Paraíba do Sul com vazão média de 5,13 m³/s, de acordo com a resolução ANA Nº 1931.
Reservatório de Três Marias, Bacia do Rio São Francisco
A vazão média afluente ao reservatório de Três Marias, no alto São Francisco, atingiu o valor de 915 m³/s, aproximadamente 85% da média para o mês de março (1072 m3/s). Nesta bacia, a precipitação foi de 145 mm em março de 2019, representando um valor de 84% da climatologia (1983-2018: 172 mm). De acordo com as projeções hidrológicas para o período de AMJ/2019, apresentadas na Figura 2, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente poderá atingir cerca de 77% da média histórica (467 m³/s, MLT[3]: 1983-2017).
Reservatório de Serra da Mesa, Sistema Araguaia-Tocantins
Na Região Centro-Oeste, a vazão média afluente ao reservatório de Serra da Mesa, no alto do Rio Tocantins, foi de 863 m³/s, aproximadamente 69% da média histórica para o mês de março (1257 m3/s). Em março de 2019, a precipitação foi de 270 mm nesta bacia, representando um valor de 28% acima da climatologia (1983-2018: 210 mm). Segundo as projeções hidrológicas para o período AMJ/2019, apresentadas na Figura 3, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente ficará em torno de 84% da média histórica (592 m³/s, MLT: 1983-2018).
Figura 2 – Cenários de vazão natural média mensal (m³/s) ao reservatório de Três Marias, para o trimestre AMJ/2019. | Figura 3 – Cenários de vazão natural média mensal (m³/s) ao reservatório de Serra da Mesa, para o trimestre AMJ/2019. |
Projeções das Reservas Hídricas de Açudes Monitorados do Semiárido Brasileiro
O açude Castanhão (Ceará), o maior da Região Nordeste, operou com 4,5% de seu volume útil no dia 8 de abril de 2019 (Figura 4), situação igualmente crítica quando comparada ao mesmo período de 2018 (4,4%). As projeções indicam que o volume armazenado nesse reservatório poderá atingir cerca de 5,5% de sua capacidade no final de junho/2019. Entretanto, esta simulação não considera eventuais armazenamentos em açudes menores na sua bacia de captação, o que pode alterar a presente simulação. O reservatório Epitácio Pessoa/Boqueirão (Paraíba) operou com 25,3% de seu volume útil no dia 7 de abril de 2019 (Figura 5), situação ligeiramente melhor que no mesmo período de 2018 (21,1%). As projeções para o reservatório Epitácio Pessoa/Boqueirão indicam que, mantendo-se as extrações atuais e considerando os aportes do Rio São Francisco (SF) e um cenário de precipitação na média climatológica, o armazenamento de água, deverá apresentar, no final de junho de 2019, cerca de 28,6% da sua capacidade total. Ressalta-se que estes cenários podem ser alterados devido a mudanças na vazão da transposição e/ou na extração de água para o abastecimento público.
Figura 4 – Projeção da evolução do volume armazenado (%) no reservatório Castanhão para o trimestre AMJ/2019. |
Figura 5 – Projeção da evolução do volume armazenado (%) no reservatório Boqueirão para trimestre AMJ/2019. |
Previsões de Vazão para a Bacia do Rio Madeira
O rio Madeira encontra-se ligeiramente abaixo do nível de transbordamento em Porto Velho. As previsões dos modelos numéricos (meteorológicos e de chuva-vazão acoplados) indicam a possibilidade de um pico de vazão para os próximos dias, embora sem atingir novamente a cota de inundação (Figura 6), o que já aconteceu em fevereiro e março de 2019. A partir do final de abril, terá início o período de vazante decorrente do declínio do período chuvoso na Bolívia.
Figura 6 – Previsão de vazão (m3/s) para o rio Madeira, em Porto Velho, segundo o modelo GloFAS acoplado ao modelo meteorológico do ECMWF (a). Cotas observadas na estação Porto Velho (15400000/ANA) (b). As linhas vermelhas e amarelas representam a vazão e a cota de transbordamento e de atenção, respectivamente.
IMPACTOS NA VEGETAÇÃO E AGRICULTURA DE SEQUEIRO
Projeção dos Impactos da Seca em todo o Brasil no Trimestre AMJ/2019
De modo geral, o cenário do Índice Integrado de Seca[4] (IIS) para o trimestre AMJ mostra que pode ocorrer uma atenuação das condições de seca, principalmente nos Estados de Sergipe e Alagoas. Considerando um cenário com chuvas 20% acima da média para o trimestre AMJ/2019, de acordo com o IIS, espera-se que ocorra uma atenuação das áreas com seca de moderada a severa em todo o Brasil (Figura 7). No cenário com chuvas 20% abaixo do esperado para o referido trimestre, os Estados de São Paulo, Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul ainda podem ser impactados por condição de seca fraca a moderada.
Figura 7 – Cenários projetados de possíveis impactos da seca em todo o Brasil para o trimestre AMJ/2019, utilizando o Índice Integrado de Seca (IIS).
Projeção dos Impactos da Seca na Agricultura Familiar de Sequeiro
A produção agrícola na Região Nordeste do Brasil e no norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo (área de atuação da SUDENE) é predominantemente formada por agricultura familiar, sendo a maior parte constituída de plantios em sistema de sequeiro, caracterizada por baixos índices de produtividade. O calendário de plantio está diretamente associado ao início da estação chuvosa em cada sub-região. De acordo com o calendário do Garantia Safra (Resolução 3, de 05 de agosto de 2010), o período de plantio ocorre entre os meses de fevereiro e abril para os municípios delimitados na Figura 8. Segundo as projeções simuladas através do IIS – que considera dados atualizados de sensoriamento remoto e projeções de chuva – os municípios localizados principalmente no sul do Maranhão e Piauí poderão apresentar condição de seca moderada no trimestre AMJ/2019. Nessas condições, poderá haver redução da produção agrícola de sequeiro. Nos demais Estados, espera-se uma condição de normalidade ou de seca fraca.
Figura 8 – Impactos da seca na agricultura de sequeiro, de acordo com o Índice Integrado de Seca (IIS), para o mês de março de 2019 (a) e projeções para o trimestre AMJ/2019, considerando um cenário de chuvas 20% abaixo (b) e 20% acima da climatologia (c). Municípios com calendário de plantio entre os meses de fevereiro a abril estão desenhados nos mapas.
NOTAS EXPLICATIVAS
Índice Integrado de Seca (IIS)
O Índice Integrado de Seca (IIS) consiste na combinação do Índice de Precipitação Padronizada (SPI) com o Índice de Suprimento de Água para a Vegetação (VSWI) ou com o Índice de Saúde da Vegetação (VHI), ambos estimados por sensoriamento remoto. O SPI é um índice amplamente utilizado para detectar a seca meteorológica em diversas escalas temporais e pode ser interpretado como o número de desvios padrões nos quais a observação se afasta da média climatológica. Um valor negativo de SPI representa condições de déficit hídrico, nas quais a precipitação é inferior à média climatológica. Um valor positivo de SPI representa condições de excesso hídrico, que indicam precipitação superior à média histórica. Para integrar o IIS, o SPI é calculado a partir de dados observacionais de precipitação disponíveis no CEMADEN, no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Centros Estaduais de Meteorologia.
Para a compilação do IIS, os dados de SPIs, na escala de 6 meses, e o VSWI ou VHI são reclassificados e compatibilizados de forma que as classes de ambos os índices traduzam as mesmas intensidades de seca, as quais variam de fraca à excepcional. O IIS é calculado mensalmente e apresentado com diferentes classes para as intensidades de seca.
Índice de Suprimento de Água para a vegetação (VSWI)
O VSWI é calculado a partir do Índice de Vegetação da Diferença Normalizada (NDVI, sigla em inglês) e da temperatura da superfície, ambos do sensor MODIS a bordo dos satélites Terra e Aqua, disponibilizadas pelo Earth Observing System (EOS/NASA). O VSWI indica condição de seca quando o valor do NDVI é baixo (baixa atividade fotossintética) e a temperatura da vegetação é alta (estresse hídrico). Portanto, o índice é inversamente proporcional ao conteúdo de umidade do solo e fornece uma indicação indireta do suprimento de água para a vegetação.
Índice de Saúde da Vegetação (VHI)
O VHI é calculado a partir do Índice de Condição da Vegetação (VCI) e do Índice da Condição da Temperatura (TCI). O VCI é a normalização do NDVI, utilizado para avaliar a densidade da vegetação em relação às condições padrões, permitindo verificar a variabilidade espacial e temporal das condições da vegetação, assim como quantificar o impacto dos eventos extremos. O TCI é considerado um indicador de estresse térmico. A umidade do solo é reduzida em um evento de seca, causando estresse térmico na vegetação. O TCI permite identificar mudanças sutis na saúde da vegetação devido a efeitos térmicos. À medida que a seca se intensifica, a umidade do solo é reduzida causando o aumento da temperatura de brilho.
Coordenador Responsável: José A. Marengo
Revisor Científico desta Edição: Marcelo Seluchi
Colaboradores: Adriana Cuartas, Ana Paula Cunha, Anna Bárbara Coutinho de Melo, Elisângela Broedel, Germano Neto, Karinne Deusdará-Leal, Lidiane Costa, Marcelo Seluchi, Márcio Moraes
1. Os relatórios com informações mais detalhadas sobre a situação atual das principais reservas hídricas e condições de seca em todo o País, bem como as projeções hidrológicas e possíveis cenários de impactos da seca, encontram-se disponíveis e atualizados na Website do Cemaden (https://www2.cemaden.gov.br).
2. As informações/produtos apresentados não podem ser usados para fins comerciais, copiados integral ou parcialmente para a reprodução em meios de divulgação, sem a expressa autorização do Cemaden/MCTIC e dos demais órgãos com os quais o Cemaden mantém parcerias. Os usuários deverão sempre mencionar a fonte das informações/dados da instituição como sendo do Cemaden/MCTIC.
3. Ressaltamos que a geração e a divulgação das informações/produtos consideram critérios de qualidade e consistência dos dados. Registramos, ainda, que os dados da rede de monitoramento de desastres naturais disponibilizados via Mapa Interativo no website do Cemaden não passaram por nenhum tratamento. Logo, poderá haver inconsistências nesses dados.
[1] O PDM/Cemaden é um modelo probabilístico baseado na umidade do solo e utiliza como entradas a precipitação e a evapotranspiração potencial para estimar a vazão.
[2] Para mais informações no que se refere à elaboração das projeções hidrológicas, consultar a Website do Cemaden:
http://www2.cemaden.gov.br/categoria/monitoramento/monitoramento-hidrologico/relatoriocantareira/
[3] A sigla MLT significa Média de Longo Termo ou, em outras palavras, média que representa a situação observada por longo período, geralmente igual ou maior que 30 anos.
[4] Explicações mais detalhadas acerca da metodologia utilizada para o cálculo do Índice Integrado de Seca (IIS) estão descritas no final desta edição.