SUMÁRIO
A presente edição do Boletim Mensal de Impactos em Atividades Estratégicas para o Brasil, elaborado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), apresenta os cenários mais prováveis de impactos de eventos extremos em diferentes setores produtivos do Brasil. Isso inclui o diagnóstico (Maio/2020) e projeção (Junho/2020) do Índice Integrado de Seca (IIS) para todo o Brasil, avaliação dos impactos da seca na agricultura familiar de sequeiro e previsão de impactos nos recursos hídricos para o trimestre junho-julho-agosto de 2020 (JJA 2020). Em particular, são abordadas a situação atual e as projeções de vazões afluentes aos reservatórios do Sistema Cantareira, Três Marias e Serra da Mesa, bem como o cenário esperado de vazão dos principais rios do país, no decorrer do referido trimestre.
A situação de armazenamento no Sistema Cantareira em 31 de maio de 2020 (58%), foi semelhante quando comparada ao mesmo período do ano de 2019. Em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, o modelo hidrológico projeta uma média de vazão afluente de, aproximadamente, 68% da média histórica (1983-2019) no trimestre JJA. Considerando este mesmo cenário hipotético de chuvas, o armazenamento no final de agosto de 2020 poderá atingir 50%, valor igual ao ocorrido no mesmo período do ano anterior. Para as bacias afluentes aos reservatórios de Três Marias e Serra da Mesa, o modelo hidrológico projeta uma média de vazão em torno de 81% e 115% da média histórica, respectivamente, situação mais otimista em comparação ao trimestre JJA de 2019 (66% e 70%, respectivamente). Os reservatórios, neste cenário, poderão atingir 78% e 37% da sua capacidade de armazenamento, respectivamente, no final do trimestre.
Para o próximo trimestre, a previsão para o Rio Solimões-AM, aponta vazões acima da média para essa época do ano.
O Índice Integrado de Seca (IIS) observado no mês de maio de 2020 indicou a intensificação da seca principalmente nos estados do Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná e Santa Catarina, com condição de seca severa e extrema em algumas regiões. Ambos os cenários do IIS para o mês de junho (considerando chuvas 30% abaixo e acima da média), indicam desintensificação das condições de seca em grande parte do Brasil.
IMPACTOS EM HIDROLOGIA
Evolução do Armazenamento no Sistema Cantareira
O Sistema Cantareira – sistema que abastece parte da região metropolitana de São Paulo – atingiu 58% de seu volume útil em 31 de maio de 2020 (Figura 1), valor idêntico ao observado no mesmo período de 2019. No mês de maio, a precipitação foi de 12 mm, o que corresponde a apenas 15% da climatologia. A média de vazão afluente aos reservatórios do Sistema Cantareira foi de 13 m³/s, representando 36% da média histórica do mês.
Em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, o modelo hidrológico PDM/Cemaden[1] projeta uma vazão afluente de, aproximadamente, 68% da média histórica para o trimestre JJA/2020. Ainda considerando este mesmo cenário de chuvas e a interligação com a bacia do rio Paraíba do Sul, o volume útil armazenado poderá atingir valores em torno de 50% em 31 de agosto de 2020, situação idêntica à observada no mês de agosto de 2019, finalizando o trimestre JJA na faixa “Atenção”.
[1] O PDM/Cemaden é um modelo probabilístico baseado na umidade do solo e utiliza como entradas a precipitação e a evapotranspiração potencial para estimar a vazão.
Para maiores informações, consulte o Boletim da Situação atual e projeção hidrológica para o Sistema Cantareira – Maio de 2020 (http://www2.cemaden.gov.br/situacao-atual-e-projecao-hidrologica-para-o-sistema-cantareira-01062020/).
Reservatório de Três Marias, Bacia do Rio São Francisco
Na bacia afluente à Usina Hidrelétrica (UHE) Três Marias, no alto São Francisco, foram registrados 40 mm de precipitação, em maio de 2020, valor 16% superior à média histórica (1983-2019: 34 mm). A média de vazão nesta bacia atingiu 387 m³/s, aproximadamente, correspondente a 95% da média para o mês de maio. O armazenamento no reservatório de Três Marias atingiu 95% em 31 de maio de 2020, valor superior ao registrado no mesmo período de 2019 (83%).
De acordo com as projeções hidrológicas para o trimestre JJA de 2020, apresentadas na Figura 2a, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão afluente poderá atingir cerca de 81% da média histórica, sendo essa situação mais favorável em comparação ao trimestre JJA de 2019 (66% da média). Adicionalmente, em um cenário de precipitação na média histórica e considerando uma média de vazão defluente igual a 450 m3/s nos meses de junho e julho, e igual a 600 m3/s no mês de agosto, o reservatório poderá atingir valores de, aproximadamente, 78% do volume útil no final de agosto de 2020.
Maiores informações podem ser encontradas no Boletim da Situação Atual e Projeção Hidrológica para o Reservatório Três Marias – Maio de 2020 (http://www2.cemaden.gov.br/situacao-atual-e-projecao-hidrologica-para-reservatorio-tres-marias-04062020/).
Reservatório de Serra da Mesa, Sistema Araguaia-Tocantins
Na bacia afluente a usina hidrelétrica Serra da Mesa, no alto do Rio Tocantins, em maio de 2020, a precipitação foi de 23 mm, correspondente a 80% da climatologia. Sua média de vazão foi de 603 m³/s, valor 20% superior à média histórica para o mês, e o reservatório operou com 37% de armazenamento em 31 de maio de 2020.
Segundo as projeções hidrológicas para o trimestre JJA de 2020, apresentadas na Figura 2b, em um cenário hipotético de chuvas na média climatológica, a vazão ficará em torno de 15% acima da média histórica do período, situação mais favorável que no trimestre JJA de 2019 (70% da média). Considerando o mesmo cenário de chuvas e uma média de vazão defluente igual a 300 m³/s, o reservatório poderá atingir 37% do volume útil no final de agosto de 2020.
Maiores informações podem ser encontradas no Boletim da Situação Atual e Projeção Hidrológica para o Reservatório Serra da Mesa – Maio de 2020 (http://www2.cemaden.gov.br/situacao-atual-e-projecao-hidrologica-para-o-reservatorio-de-serra-da-mesa-bacia-do-rio-tocantins-02062020/).
Seca na Região Sul do Brasil
Desde o segundo semestre de 2019, tem-se observado déficit de chuvas em toda a Região Sul do Brasil, resultando na redução das vazões dos rios. Nos últimos meses registrou-se valores de vazão em torno dos mínimos históricos, e consequentemente, ocorreu uma severa diminuição do nível dos reservatórios, causando impactos na geração de energia elétrica e no abastecimento de água nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
A bacia afluente a UHE Itaipu, localizada no Rio Paraná – Santa Catarina, apresentou uma média de vazão afluente de 6.922 m³/s, correspondente a 66% da média histórica para o mês de maio (10.499m3/s para o período 1993-2019), valor inferior à vazão mínima registrada (8.441 m3/s em 2019). A vazão média afluente à usina hidrelétrica Segredo (Gov. Ney Aminthas de Barros Braga), localizada no Rio Iguaçu – Paraná, foi de 96 m³/s, aproximadamente 13% da média histórica para o mês de maio (759 m3/s no período de 1993-2019), e o armazenamento médio atingiu 27% do volume útil, segunda menor média mensal do histórico (menor média mensal, 16% do volume útil, ocorreu no ano de 2000). Adicionalmente, na bacia de drenagem da UHE Passo Real, localizada no Rio Jacuí – Rio Grande do Sul, a média de vazão afluente foi 75 m³/s, correspondente a 39% da média histórica do mês de maio (193 m3/s), e o armazenamento médio atingiu 32% em maio de 2020, menor média mensal do histórico.
Projeções de Vazão para a Bacia do Rio Amazonas
O Rio Solimões em Manacapuru-AM encontra-se em período de enchente, com cota de 1926 cm na data de 15 de junho de 2020 (segundo dados da estação hidrometeorológica da Agência Nacional de Águas – ANA), correspondente a um valor superior à média climatológica e configurando uma cheia com período de retorno acima de 2 anos.
A previsão sazonal para os meses de junho, julho e agosto pelo modelo Global Flood Awareness System (GloFAS) para o Rio Solimões, próximo ao ponto de confluência com o Rio Negro (Figura 3), aponta para vazões acima do normal para essa época do ano. A tendência de vazões acima da média vem sendo observada desde o mês de abril.
Por ser de grande porte, o Rio Solimões regula o nível em Manaus por efeito de remanso e por esse motivo seu comportamento deve ser acompanhado durante os próximos meses.
IMPACTOS NA VEGETAÇÃO E AGRICULTURA
Índice Integrado de Seca (IIS): observado para o mês de maio de 2020 e projeção para o mês de junho de 2020 em todo o Brasil
O IIS observado no mês de maio de 2020 aponta a intensificação da seca principalmente nos estados do Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná e Santa Catarina, com ocorrência de seca severa e extrema em algumas regiões (Figura 4a). Por outro lado, ambos os cenários do IIS para o mês de junho (considerando chuvas 30% abaixo e acima da média), indicam desintensificação das condições de seca em grande parte do Brasil (Figuras 4b, 4c). Apesar desse cenário, na Região Sul, no estado de São Paulo e sul do Mato Grosso do Sul, permanece a condição de seca moderada em grande parte da área, além da condição de seca severa em pontos isolados.
Maiores informações sobre as condições de secas e impactos no Brasil podem ser encontradas no Boletim de Monitoramento de secas e impactos no Brasil – Maio/2020 (http://www2.cemaden.gov.br/monitoramento-de-secas-e-impactos-no-brasil-maio2020/).
Impactos da seca na produção agrícola de sequeiro – região Sul do Brasil e São Paulo
Para a Região Sul, em relação ao mês de abril, o IIS no mês de maio (Figura 5a), mostra que houve desintensificação da seca no estado do Rio Grande do Sul, e intensificação, principalmente na região centro-leste do estado de Santa Catarina e no nordeste do Estado do Paraná, variando de fraca à extrema. Em decorrência da severidade da seca associada às elevadas temperaturas observadas em toda a região, perdas significativas na agricultura têm ocorrido nos três estados da Região Sul.
Para o estado do Paraná foram registradas perdas na produção de milho 2ª safra, estimadas em 13% (1,6 milhão de toneladas) em relação à expectativa inicial. O mesmo para a produção de feijão 2ª safra, perdas estimadas em 25% em relação à safra anterior, de acordo com o Departamento de Economia Rural (Deral).
No Estado de Santa Catarina, as perdas na produção de soja em relação à estimativa inicial da safra atual (em fase de fechamento da safra, com quase todas as lavouras colhidas) foram de aproximadamente 133 mil toneladas, o equivalente a cerca de R$ 200 milhões. Tanto a produção de feijão 1ª safra quanto a de 2ª safra também foram afetadas, com perdas em torno de 4% e 14%, respectivamente, em relação à safra 2018/19. Houve, ainda, perdas na produção do milho 1ª e 2ª safra que se aproximam de 10% e 20%, respectivamente, em comparação à safra 2018/19. Dessa forma, é esperada uma redução superior a 10% na produção total de milho (300 mil toneladas), em relação à safra anterior. As regiões de Curitibanos e Campos de Lages mantiveram-se como as mais afetadas pela seca no estado, com redução na produtividade de milho estimada em 25% e 43%, respectivamente, e perdas entre 20% e 30% na produtividade de soja, conforme dados do Boletim Agropecuário Epagri/Cepa de maio de 2020.
No Rio Grande do Sul, o cultivo da soja já foi 100% colhido, com perdas de 46% na produção em relação ao esperado. Elevadas perdas na produtividade do grão ocorreram em diversas regiões do estado, como Santa Rosa (superiores a 70% em algumas áreas) e Porto Alegre (55%). Perdas significativas também têm ocorrido na produtividade do milho, nas regiões de Santa Maria (de até 65%) e Pelotas (média de 66%), dentre outras. Enquanto o feijão, a 2ª safra tem acumulado perdas na produtividade em cerca de 39% e 47% nas regiões de Frederico Westphalen e Porto Alegre, respectivamente, onde ainda há lavouras nas fases de florescimento, enchimento de grãos e maturação. Em razão destes prejuízos, muitos produtores prejudicados continuaram solicitando vistoria para a cobertura do Proagro (Programa de Garantia da Atividade Agropecuária), segundo a Emater/RS-Ascar.
Considerando os cenários (chuvas 30% abaixo e 30% acima da média), o IIS projetado para o mês de junho mostra amenização das condições de seca em toda a região Sul do país (Figuras 5b, 5c). No entanto, permanece condição de seca moderada em aproximadamente 40% dos municípios, de seca severa em 9% dos municípios e de seca extrema em menos de 1% dos municípios da região.
Para o Estado de São Paulo, em relação ao mês de abril, o IIS no mês de maio (Figura 6a) mostra intensificação das condições de seca em todo o estado, estas variando de fraca a extrema. Em decorrência das condições de seca observadas, há possibilidade de perdas na produção do milho 2ª safra no estado.
Em um cenário mais crítico, considerando chuvas 30% abaixo da média (Figura 6b), o IIS para o mês de junho de 2020 indica para a região central do estado de São Paulo, condições de seca moderada a severa. Por outro lado, em um cenário considerando chuvas 30% acima da média (Figura 6c), o IIS para o mês de junho aponta para atenuação das condições de seca em grande parte do estado, mas ainda com ocorrência de seca fraca a severa em municípios da parte central do Estado.
CONDIÇÕES DE SECAS E IMPACTOS: MAIO/2020
[2] A sigla MLT significa Média de Longo Termo ou, em outras palavras, média que representa a situação observada por longo período, geralmente igual ou maior que 30 anos.
CONDIÇÕES DE SECAS E IMPACTOS: POSSÍVEIS CENÁRIOS
NOTAS EXPLICATIVAS
Índice Integrado de Seca (IIS)
O Índice Integrado de Seca (IIS) consiste na combinação do Índice de Precipitação Padronizada (SPI) com o Índice de Suprimento de Água para a Vegetação (VSWI) ou com o Índice de Saúde da Vegetação (VHI), ambos estimados por sensoriamento remoto. O SPI é um índice amplamente utilizado para detectar a seca meteorológica em diversas escalas temporais e pode ser interpretado como o número de desvios padrões nos quais a observação se afasta da média climatológica. Um valor negativo de SPI representa condições de déficit hídrico, nas quais a precipitação é inferior à média climatológica. Um valor positivo de SPI representa condições de excesso hídrico, que indicam precipitação superior à média histórica. Para integrar o IIS, o SPI é calculado a partir de dados observacionais de precipitação disponíveis no CEMADEN, no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Centros Estaduais de Meteorologia.
Para a compilação do IIS, os dados de SPIs, na escala de 6 meses, e o VSWI ou VHI são reclassificados e compatibilizados de forma que as classes de ambos os índices traduzam as mesmas intensidades de seca, as quais variam de fraca à excepcional. O IIS é calculado mensalmente e apresentado com diferentes classes para as intensidades de seca.
Índice de Suprimento de Água para a vegetação (VSWI)
O VSWI é calculado a partir do Índice de Vegetação da Diferença Normalizada (NDVI, sigla em inglês) e da temperatura da superfície, ambos do sensor MODIS a bordo dos satélites Terra e Aqua, disponibilizadas pelo Earth Observing System (EOS/NASA). O VSWI indica condição de seca quando o valor do NDVI é baixo (baixa atividade fotossintética) e a temperatura da vegetação é alta (estresse hídrico). Portanto, o índice é inversamente proporcional ao conteúdo de umidade do solo e fornece uma indicação indireta do suprimento de água para a vegetação.
Índice de Saúde da Vegetação (VHI)
O VHI é calculado a partir do Índice de Condição da Vegetação (VCI) e do Índice da Condição da Temperatura (TCI). O VCI é a normalização do NDVI, utilizado para avaliar a densidade da vegetação em relação às condições padrões, permitindo verificar a variabilidade espacial e temporal das condições da vegetação, assim como quantificar o impacto dos eventos extremos. O TCI é considerado um indicador de estresse térmico. A umidade do solo é reduzida em um evento de seca, causando estresse térmico na vegetação. O TCI permite identificar mudanças sutis na saúde da vegetação devido a efeitos térmicos. À medida que a seca se intensifica, a umidade do solo é reduzida causando o aumento da temperatura de brilho.
Coordenador Responsável: José A. Marengo
Revisor Científico desta Edição: José A. Marengo, Marcelo Seluchi
Colaboradores: Adriana Cuartas, Ana Paula Cunha, Ana Paula dos Santos, Conrado Rudorff, Daniela França, Elisângela Broedel, Fabiani Bender, Karinne Deusdará-Leal, Lidiane Costa, Marcelo Seluchi, Marcelo Zeri, Márcio Moraes, Rafael Luiz, Valesca Fernandes, Vinicius Sperling
1. Os relatórios com informações mais detalhadas sobre a situação atual das principais reservas hídricas e condições de seca em todo o País, bem como as projeções hidrológicas e possíveis cenários de impactos da seca, encontram-se disponíveis e atualizados no Website do Cemaden (https://www2.cemaden.gov.br).
2. As informações/produtos apresentados não podem ser usados para fins comerciais, copiados integral ou parcialmente para a reprodução em meios de divulgação, sem a expressa autorização do Cemaden/MCTIC e dos demais órgãos com os quais o Cemaden mantém parcerias. Os usuários deverão sempre mencionar a fonte das informações/dados da instituição como sendo do Cemaden/MCTIC. Ressaltamos que a geração e a divulgação das informações/produtos consideram critérios de qualidade e consistência dos dados.
3. Registramos, ainda, que os dados da rede de monitoramento de desastres naturais disponibilizados via Mapa Interativo no website do Cemaden não passaram por nenhum tratamento, portanto poderá haver inconsistências nesses dados.